Turma reunida no encerramento das atividades |
Durante oito encontros, divididos em duas fases entre agosto e setembro de 2017, conduzi um Ateliê de Dramaturgia e Memória no Recife como parte das atividades do programa Sesc Dramaturgias. O que segue é um resumo bem resumido do que foi a grandeza dos Encontros.
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O
objetivo geral da atividade foi trabalhar a memória na dramaturgia a partir dos três pilares da pedagogia das Artes: conhecer, fruir e criar.
Para
tanto, formamos um repertório comum de peças teatrais a serem lidas por todos,
de preferência previamente ao Ateliê. Tais obras pertencem a
várias fases do teatro brasileiro, apresentam-se em formatos que vão desde o dramático até as
propostas menos vinculadas ao drama e têm todas a memória pessoal ou social como
motivador, tema ou recurso formal. Ainda que não lidas em sua totalidade para a
primeira fase, serviram como referência durante os encontros, citadas ou
mencionadas em fragmentos.
Atividade escrita na primeira fase do Ateliê |
Durante as sessões os participantes desenvolveram textos a
partir dos seguintes princípios: memória pessoal, memória relacionada a outra pessoa, memória relacionada a objetos e, por fim, memória social. Sempre referenciadas pelas peças teatrais do acervo comum, bem como orientadas com relação à forma e a procedimentos em geral, as escritas contemplaram narrativas, depoimentos, relatos, roteiros de ação e cenas dialogadas.
Pretendeu-se a experimentação de diferentes formatos, todos relacionados às mais diversas fontes memorialísticas, dentre elas, a pesquisa histórica.
Como ocorre em todos os Ateliês, a teoria é suscitada pela prática. Assim, os textos criados
em sala são lidos e analisados por todos e as demandas teóricas são supridas de
imediato sempre que possível. As orientações que antecedem a escrita dos textos
são, em sua maioria, básicos da linguagem: tipos de discurso, tipos de
narrador, tempos verbais, formatos, bem como esboço, roteiro de ações,
estruturação, etc. Básico também é o entendimento de dramaturgia como tessitura
de ações, ou seja, o texto verbal é apenas um dos fios que compõem a escritura
cênica e todos os demais precisam ser levados em consideração, até mesmo o que se refere ao público. A ideia de dramaturgia como rapsódia e não apenas como diálogo interpessoal em um
fluxo causal foi outro aspecto estudado tanto na análise das peças quanto na prática.
Registro da primeira fase, em agosto |
O plano inicial do Ateliê era que, na segunda etapa, cada um desenvolvesse um projeto pessoal. Uma série de ocorrências, porém, motivou a mudança do percurso: muitos trabalhos escolares, outras prioridades e a participação quase maciça no III Usina Teatral promovido pelo SESC e que tinha como tema o Teatro e a Memória. O evento traria mesas de debates, oficinas e espetáculos que, se efetivamente vivenciados, poderiam estabelecer várias conexões com o próprio Ateliê.
Ficou
decidido em comum acordo que no intervalo entre os dois momentos haveria participação no máximo de atividades
possível do Usina. Decidiu-se igualmente que todos leriam “A moratória” de Jorge Andrade e “Caranguejo
overdrive” de Pedro Kosovski a fim de traçarmos um paralelo entre as duas obras
do ponto de vista das motivações, dos modos de criação, da forma como conteúdo
precipitado, das disputas simbólicas presentes nos diferentes contextos, etc.
E, finalmente, que seria lido um material acadêmico sobre o Mercado de São
José com o objetivo de dialogar com os dois textos analisados e gerar um
projeto coletivo. Assim foi feito.
Mercado de São José - parte da área de pescados |
Alguns dos temas levantados na análise das duas peças foram a base para a reflexão coletiva do artigo sobre a história do Mercado. Formamos assim, a base estética e histórica para um de nossos projetos coletivos. Seguimos, então, para a deriva no local a fim de realizar uma apreciação arquitetônica, ambiental e humana: depois das devidas orientações, o grupo percorreu o lugar e realizou observações e anotações individuais, posteriormente compartilhadas com os colegas em sala - atividade que terá uma postagem específica no blog.
Desse
conjunto de procedimentos, cada participante selecionou um momento de disputa
simbólica relacionada ao Mercado (dentre cinco) e criou ou
selecionou duas personagens a serem desenvolvidas. Da seleção resultaram dois roteiros de ações e uma narrativa ou duas, isto é, dois pontos de vista sobre uma mesma ocorrência. A essa altura, reunimos todas as pontas anteriores do Ateliê:
escritas individuais em terceira pessoa, em primeira e diálogos – todos
envolvendo a memória.
No
último encontro, promovemos a vivência de um coletivo de dramaturgia: dividimos a turma em três grupos de acordo com as preferências temáticas dos
projetos "Mercado de São José", "Personagem marcante" e "Momentos marcantes" - todos a partir da reunião dos textos individuais da primeira fase e da segunda fase do Ateliê.
Participantes trabalham na biblioteca da Unidade a composição da dramaturgia em grupo |
Cada uma das equipes tratou de elaborar um projeto com
conceito, utilização dos escritos, trilha sonora, hipertexto, definição de
espaço de apresentação, entre outros detalhes, e de apresentar ao coletivo no
final da sessão. Pediu-se
que observassem a si mesmos e aos demais numa situação de coletivo de
dramaturgia e que isso também fosse levado em conta na hora do compartilhamento
geral.
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A
divisão em duas etapas permitiu que os elementos básicos fossem trabalhados na
primeira semana e, amadurecidos, tornassem possíveis exercícios mais complexos
na segunda fase. O grupo respondeu muito bem às proposições e espero que os encontros tenham despertado o interesse para futuras leituras,
buscas e para o desenvolvimento de projetos individuais e coletivos
relacionados à Memória.
Deixo aqui meu agradecimento a toda a equipe Sesc e especialmente a cada participante. A cumplicidade necessária para a formação de um coro de escrevedores esteve presente todo o tempo, o que gerou confiança para o compartilhamento, cuidado e generosidade nos momentos de análise mútua dos textos criados. Num Ateliê de Dramaturgia em que se pressupõe a horizontalidade das relações, o posicionamento ativo do coro é ponto chave para o desenvolvimento individual e coletivo. E mais, num tempo de desmontes da Cultura, saber tanta gente dedicada à reflexão e à criação é um verdadeiro alento.
A todes o meu abraço registrado e juramentado nesse blog. A declaração de amor eu já fiz pessoalmente.
Adélia Nicolete
Para mim a experiência do ateliê começou por aqui! Justamente nesse blog. Não imaginava que pudesse vivenciar tão próximo essa experiência e um dia fazer parte desse registro aqui no blog. Adélia você é mais linda e maravilhosa do que eu imaginava só de te ler por aqui. Vida longa ao ateliê!
ResponderExcluirBeijos. Bruno
Bruno, é muito sério isso tudo! Passamos um tempo nas virtualidades, nessa troca tão intensa mesmo sem nos conhecermos. Daí o contato direto se mostra uma confirmação do que intuído estava: nossos santos bateram mesmo, não era idealização. Você é de verdade um amor de pessoa, tem uma capacidade criativa e uma generosidade comprovadas e o que é melhor: tem bom humor! Que delícia! Mais alguém para amar, nesse tempo em que tantos se negam. Vamos em frente! Obrigada!
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