quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Dona Bem, guardiã da memória - Parte II: caverna do tesouro


Dos meus livros de infância, um dos preferidos era “As mais belas histórias”, organizado por Lúcia Monteiro Casasanta. Nele eu encontrava Esopo, irmãos Grimm, Andersen, mas também mitologia e alguns autores brasileiros. Lia e relia, sempre com interesse renovado. As histórias alimentavam-me a alma e, hoje sei, o imaginário. Tanto que, ao visitar o “Cantinho da Vovó Bem” lá em Poconé, tive a impressão de adentrar na caverna de Ali Babá!

Uma das salas do museu domiciliar de Dona Bem
(Foto: internet)

Ali estão guardados tesouros recolhidos durante décadas. Objetos de família a registrar artes e ofícios, hábitos e costumes da vida pantaneira. Outros foram trazidos por amigos ou garimpados nas fazendas e na vizinhança, graças a indicações: “Dona bem, em tal lugar tem coisa pro seu museu!”. E lá vai a colecionadora buscar e salvaguardar do esquecimento.

O hábito pantaneiro do guaraná em pó e
os apetrechos utilizados para consumo em casa e
nas viagens
(Foto: internet)

Louças antigas
(Foto: internet)

A princípio o acervo estava disposto de modo informal e intuitivo. Depois de alguns anos de atendimento, porém, ao receber a visita de representantes do Cadastro Nacional de Museus, a exposição foi organizada por grupos de objetos e dividida em dois ambientes.

No primeiro plano, a prensa de modelar ladrilhos hidráulicos
(Foto: internet)

A área que abriga os objetos da cozinha pantaneira
(Foto: Adélia Nicolete)

Não se trata de um museu nos padrões consagrados, pois ali não encontramos legendas ou placas de identificação. Talvez seja essa a maior motivação para se conhecer o espaço: ali tudo ganha vida e sentido pela voz de Dona Bem. O percurso que ela tanto conhece, as histórias ligadas a cada objeto – sua origem, sua utilização, as circunstâncias que o levaram até ali – as comparações entre hoje e os antigamentes só podem ser conhecidos na relação, no diálogo com a colecionadora. Não fosse assim, tudo se transformaria em coisa velha, todo o tesouro de Ali Babá perderia o brilho aberta a caverna.

(Foto: Adélia Nicolete)

Iniciativas como o Cantinho da Vovó Bem precisam ser conhecidas e divulgadas. Sinalizam o esforço pessoal de preservação da memória não só pela conservação material, mas pelo convívio com testemunhas de outros tempos. Ali se dá o diálogo vivo entre passado e presente, entre memória e História, para além do poder público, das burocracias, da máquina que dificulta a composição e a manutenção de acervos a ponto de incendiá-los.

Adélia Nicolete

Veja aqui a postagem anterior e saiba mais sobre Vovó Bem e como chegar ao seu Cantinho. 


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